Em decisão de 9 de setembro de 2014, o ministro Teori Zavascki, a pedido da CPI da Petrobras, deferiu “o requerimento para determinar o encaminhamento, à Comissão requerente, de cópia integral dos autos da Reclamação 17.623 e da Pet. 5170, em meio eletrônico (edição vedada), em prazo não superior a 48 (quarenta e oito) horas”, entendendo que “é certo que o artigo 58, parágrafo 3º, da Constituição da República dispõe que as Comissões Parlamentares de Inquérito terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas. Verificada a competência constitucionalmente atribuída às referidas comissões para realizar atividade apuratória, nada impede o compartilhamento das provas obtidas em investigação judicial, quando presente correlação entre os objetos das aludidas apurações, ressalvadas, todavia, as restrições de publicidade inerentes a autos que tramitem em segredo de Justiça”. Essa determinação trouxe novamente à discussão as balizas de atuação das Comissões Parlamentares de Inquérito, que no exercício da função típica do Poder Legislativo consistente no controle parlamentar, devem fiscalizar especialmente os atos da Administração Pública, com poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas Casas, e serão criadas pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, em conjunto ou separadamente, mediante requerimento de um terço de seus membros, para apuração de um fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores. As CPIs terão os mesmos poderes instrutórios que os magistrados possuem durante a instrução processual penal, inclusive com a possibilidade de invasão das liberdades públicas individuais, salvo quando presente a exigência da cláusula de reserva jurisdicional, como por exemplo, para expedição de mandado de busca e apreensão domiciliar e determinação de interceptação telefônica, pois como salientam Canotilho e Vital Moreira, “os poderes das comissões de inquérito têm um limite naqueles direitos fundamentais dos cidadãos que, mesmo em investigação criminal, não podem ser afectados senão por decisão de um juiz” (Constituição da república portuguesa anotada. 3. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1993. p. 720), uma vez que, conforme adverte o ministro Celso de Mello, a presença expressa dessa cláusula consubstancia “ao Poder Judiciário, não apenas o direito de proferir a última palavra, mas, sobretudo, a prerrogativa de dizer, desde logo, a primeira palavra, excluindo‑se, desse modo, por força e autoridade do que dispõe a própria Constituição, a possibilidade do exercício de iguais atribuições, por parte de quaisquer outros órgãos ou autoridades do Estado” (MS 23.452‑1/RJ). A atuação livre das comissões parlamentares de inquérito é consagrada pela Constituição Federal como verdadeiro direito das minorias parlamentares, com fundamento como ensina o ministro Celso de Mello, “no direito de oposição, legítimo consectário do princípio democrático” (STF – Pleno – MS 24831/DF; MS 24845/DF). O exercício das competências congressuais, logicamente, deverá ser exercido dentro dos mesmos limites constitucionais impostos ao Poder Judiciário (STF, MS 23.491‑1/DF), seja em relação ao respeito aos direitos fundamentais (STF, MS 23.452‑1/RJ), seja em relação à necessária fundamentação e publicidade de seus atos, seja, ainda, na necessidade de resguardo de informações confidenciais e preservação dos direitos dos investigados, inclusive no caso em questão dos delatores, pois, conforme decidido em situações conexas pela Corte Suprema Norte Americana, “o Bill of Rights é aplicável aos inquéritos parlamentares, do mesmo modo que a todas as outras formas de ação governamental” (Watkins v. United States. 354 US 178 – 1957 – Chief Justice Warren). Assim, para que o Congresso Nacional exercite seu legítimo direito de minoria e consagre a efetividade do princípio democrático, o Supremo Tribunal Federal já definiu como regra em nosso ordenamento jurídico que o paradigma para os poderes das CPIs deve ser o conjunto de competências que os magistrados possuem durante a instrução processual penal, relacionados à dilação probatória, em busca da verdade material, nos mesmos termos proclamados pela lei fundamental alemã, que em seu artigo 44, item 2, ao se referir as comissões de inquérito, estabelece que “as disposições relativas ao processo penal terão aplicação por analogia à apuração de provas”. Ressalte-se, ainda, que as investigações realizadas por CPIs comportam integralmente o compartilhamento de todas as provas essenciais para a investigação congressual, para que haja o efetivo e pleno exercício constitucional da competência das comissões de inquérito em promover a investigação de fatos que estejam inclusive sendo investigados em outros inquéritos ou processos judiciais conexos, inclusive, tendo a CPI direito ao pleno acesso ao compartilhamento de provas e documentos existentes nessas outras investigações, mesmo que sigilosas (HC 100.341), e em relação àqueles depoimentos obtidos mediante delação premiada junto ao Ministério Público se conexos com os fatos apurados pela CPI, pois na obtenção desse meio de prova não se aplica a cláusula de reserva jurisdicional. Como bem destacado por nossa Corte Suprema, “o inquérito parlamentar, realizado por qualquer CPI, qualifica‑se como procedimento jurídico‑constitucional revestido de autonomia e dotado de finalidade própria, circunstância esta que permite à Comissão legislativa — sempre respeitados os limites inerentes à competência material do Poder Legislativo e observados os fatos determinados que ditaram a sua constituição — promover a pertinente investigação, ainda que os atos investigatórios possam incidir, eventualmente, sobre aspectos referentes a acontecimentos sujeitos a inquéritos policiais ou a processos judiciais que guardem conexão com o evento principal objeto da apuração congressual” (MS 23.639‑6/DF. Conferir no mesmo sentido: MS 23.652‑3/DF). Qualquer cerceamento direcionado às CPIs em relação ao integral, legítimo e efetivo exercício do direito de investigação das minorias parlamentares, inclusive na produção e compartilhamento de provas existentes em procedimentos conexos será flagrantemente inconstitucional, caracterizando desrespeito frontal ao direito de minorias parlamentares e ao princípio democrático, em verdadeiro desrespeito ao aprofundamento democrático da ordem política, impedindo a plena e integral participação popular — por meio de seus representantes eleitos e componentes de Comissões Parlamentares de Inquérito — de todos e de cada uma das pessoas na vida política do país, em especial, na fiscalização dos atos ilícitos praticados pela Administração Pública, afastando o necessário processo de democratização, que como ensinam Canotilho e Vital Moreira (Fundamentos da Constituição. Coimbra: Coimbra Editora, 1991. p. 195), é essencial para o respeito à soberania popular e concretização da Democracia, existente somente onde há real fiscalização dos governantes escolhidos mediante eleições honestas e livres, como relembra Maurice Duverger (Os partidos políticos. Rio de Janeiro: Zahar, 1970. p. 387). Nesse verdadeiro processo de democratização, a representação política, como apontado por Carl J. Friedrich (Gobierno constitucional y democracia. Madri: Instituto de Estudios Políticos, 1975. p. 16 ss.), não deve ser meramente teórica, pois uma democracia autêntica e real exige o efetivo exercício das competências constitucionais previstas aos poderes constituídos, e, em especial ao Congresso Nacional, como verdadeiro corolário ao direito de cidadania dos representados. O princípio democrático não permite o cerceamento inconstitucional das CPIs no exercício de sua missão constitucional, pois tendo todos os “poderes de investigação vinculados à produção de elementos probatórios para apurar fatos certos” (STF, MS 23.471/DF), deverá ter pleno acesso e compartilhamento ao material probatório para cumprir sua finalidade constitucional, desde que resguarde o sigilo do mesmo quando necessário, pois como ressaltado pelo ministro Marco Aurélio, “o que se contém no parágrafo 3o do artigo 58 da Constituição Federal, relativamente ao vocábulo poderes, não pode ser dissociado do fim último das Comissões Parlamentares de Inquérito, ou seja, a investigação” (MS 23.454‑7/DF). O ferimento das competências constitucionais das Comissões Parlamentares de Inquérito consistirá em perigoso aumento do indesejável distanciamento entre a vontade popular — que, clama pela responsável e eficaz investigação dos fatos — e seus congressistas, acarretando funesto agravamento na crise de representação parlamentar e fatal desvirtuamento da democracia representativa, que somente se fortalece quando os representantes gozam da confiança dos representados por exercer suas competências, como bem advertido por Norberto Bobbio (O futuro da democracia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986. p. 42), sob pena de ocorrência da advertência de Dalmo Dallari, para o “descrédito dos corpos representativos e o consequente desinteresse popular pelas eleições” (O renascer do Direito. 2. Ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 132). 

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